segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Quem quer viver para sempre?



É difícil começar a escrever sobre um assunto que promete ser comum, batido, vulgar. É complicado tentar abordar um ponto que inquieta a todos, ou pelo menos a muitos, de forma a buscar um aspecto ou reflexão diferente nele. É cansativo, em matéria de material humano, ser original.

Mas continuo tentando.

Queria falar hoje aqui de uma questão importante, comumente tratada - em ambos os sentidos: tanto de ser várias vezes levantada quanto de receber respostas comuns, meio "blé", sem graça. "Por que estamos aqui?"; "Para onde vamos?"; "Qual é o sentido da vida?". Não, não! Sem essas perguntas existenciais e chatolinas. Desejo ir, na verdade, um pouco além dessa linha supostamente profunda, mas, afinal, leviana. É uma questão que engloba todas essas e vai além: O que é que nós deixamos para trás?

Eu fico olhando algumas coisas e meditando... Tipo essa 11ª edição da maior encheção de saco de todos os tempos da TV brasileira: Big Brother Brasil. Não, não, me recuso a gastar um post dedicado a esta bodega (eu tento ser delicada no meu blog, tá!), até porque em um anterior já gastei muito tempo e esse é um tratamento do qual não acredito ser este programinha merecedor. Mas quando páro para analisar... Ele é um retrato dessa sede, que não é peculiar somente aos brasileiros mas ao ser humano em geral, de fama. Fama, fama, fama. Yes holofotes, no anonimato. Essa ânsia toda, que me dá às vezes ânsia de vômito, é fruto de uma necessidade esquisita de, por algum meio, "perpetuar-se". É resultado de uma lógica ilusória segundo a qual, através da exposição a um número cada vez maior de pessoas, se consegue permanecer, de alguma forma, vivo eternamente, já que sabemos que todos morremos um dia. É ilusória inclusive porque essa fama medíocre que se consegue só dura alguns meses, tamanha mediocridade. Se todo mundo souber meu nome, seja lá pelo que eu tenha feito, se eu tiver mérito ou não, de alguma forma eu vou viver pra sempre nesse mundo... Será?

Não estou querendo bancar Freud, embora haja um embasamento teórico dentro da Psicologia para isso de que falo aqui. Porém, não precisa ser dessa área pra se entender o que estou falando: faz parte de nós todos. Afinal, ninguém quer morrer. Inclusive, o Homem, através de suas ciências, às vezes pouco cientes de riscos ou responsabilidades, dá piruetas loucas para tentar encontrar maneiras não só de aumentar a sua longevidade mas de, quem sabe, eliminar o último dia de vida na Terra. É, em parte, nosso instinto de sobrevivência e, no todo, nossa falta de fé ou de noção. Na verdade, também advém do nosso espanto diante da fragilidade da vida.

Pelo menos para mim, isso salta aos olhos. Nossa imensa fragilidade. Acompanhamos, nas últimas semanas, as tragédias, perdas e mortes causadas pelas chuvas na região serrana do Estado do Rio de Janeiro. É triste ver o desalento, o medo, a falta de recursos de tantos que se sentem abandonados pelas autoridades, entregues à própria sorte, à mercê de um destino incerto. Dói no coração ver na TV aquelas pessoas dizendo que não tem para onde ir e perderam tudo. E as cenas, devastadoras e impressionantes, nos mostram novamente como tudo aqui neste mundo é delicado, volúvel, temporário. Num instante, está tudo aqui, perfeito, intacto; no outro, está em outro lugar, sabe-se lá Deus onde e como, carregado por um temporal. Telhados, móveis, casas... e também, inevitavelmente, vidas. É doloroso e difícil de encarar, por isso relutamos tanto, mas torna-se visível que as coisas aqui desta Terra não são feitas para durar para sempre. Como diria George Harrison, "all things must pass away".

Entretanto, é desconcertante. É dificil aquiescer diante do fato de que temos um fim (uma finalidade e um término). Porque fere nosso orgulho, porque na nossa vaidade queremos ser onipresentes, oniscientes, onipotentes, totalmente perenes. Por isso que a fama nos infla, excita, instiga e até acalma, mas essa sensação de preenchimento só dura alguns instantes, pois não é sólida: é etérea, esfumaçada, inconstante. Não é verdadeira.

Por outro lado, é tão bonito ver a iniciativa de tantas pessoas, dispostas a sacrificar-se e comprometer-se para ajudar essas inúmeras vidas prejudicadas. Faz-nos acreditar na bondade do ser humano, no fato de que a autêntica filantropia não se escora somente na base de se conhecemos quem é necessitado de ajuda ou não, se é nosso irmão, um parente ou um amigo e, sim, simplesmente porque o outro é um ser tão humano quanto nós. Diante disso, eu pergunto: por que não é esse tipo de fama que se deseja ter, ao invés de ser reconhecido pelo tamanho do "derrière" ou por quantas besteiras se faz? Por que não deixar pra trás, pros lados, em todo um redor, um rastro de luz que emana da bondade, do amor, da compreensão, do auxílio?

E é aí que vejo que o problema está na perspectiva sob qual se enxerga esse quadro. Não é fama que se deve buscar! Não é reconhecimento, não é holofotes, por mais que essas coisas afaguem nosso ego e endossem nossa vaidade. A melhor forma de deixar uma marca nas pessoas com as quais se convive, no meio em que se está inserido, é procurar fazer o bem, amar, ser melhor enquanto ser humano, não o mais famoso ou mais reconhecido. Estamos numa era em que se mede o quanto se é de acordo com o número de pessoas que visitam perfil do Facebook ou Orkut, quantos seguidores se tem no Twitter, quantas pessoas vêem as fotos colocadas na Internet, quantas vezes se é o centro das atenções e dos assuntos. Porém, é só parar e pensar como isso é, no fundo, estupidamente ridículo; afinal, qual é a diferença? "Hoje é o dia da caça, amanhã do caçador". Hoje somos louvados e observados, amanhã ignorados e esquecidos. Porque nada disso é relevante, nada disso muda a vida de alguém, não toca pessoas, não é diferente. É inútil.

É como no filme "Sociedade dos Poetas Mortos", o meu favorito: é tão lindo ver como uma pessoa, com intuito de fazer a diferença não para ser famoso, mas para transmitir um significado profundo de vida que atribua sentido àquelas que estão à sua volta, é capaz de exercer tamanha influência, provocar tantas mudanças. Um professor de inglês, apaixonado pela vida e pelo amor, com sua simplicidade e paixão, afetou a vida de muitos estudantes. Não precisou sair em capa de revista ou escrever artigos pro New York Times. Do lugar onde estava, ainda que discreto e modesto, porque tinha uma intenção reta e sincera, tocou tantos corações, e esses corações posteriormente tocariam tantos outros: esse é o mais contundente e eficiente efeito dominó, acreditem. Esse é um dos melhores exemplos para mim. Aliás, os exemplos anônimos frequentemente são os melhores.

Fica a pergunta: por que ações você gostaria de ser lembrado(a)? As suas atitudes sequer fazem com que você queira ser lembrado(a)? O que você gostaria de deixar para trás para as pessoas que te conhecem? O que você faz de bom para tocar outras vidas e fazê-las lembrarem de você? O que você faz para fazer bem aos outros?

E se é para se ater somente ao quesito da famosidade, pensemos em exemplos de pessoas que alcançaram fama por uma genuína intenção de acrescentar algo de bom à humanidade, por amar os outros próximos ou distantes, seus semelhantes. Ou aqueles os quais utilizaram a fama conquistada ou entregue de alguma forma para fazer algo que realmente valesse a pena. São muitas as personalidades as quais citar: Papa João Paulo II, Madre Teresa de Calcutá, São Thomas More, Gandhi, Audrey Hepburn, John Lennon, Princesa Diana, Martin Luther King Jr., George Harrison, Linda Eastman, Dra. Zilda Arns, Paul McCartney, Robert Kennedy, Immaculée Ilibagiza... tantos, tantos, tantos: eu mencionei os que me falam mais profundo e fortemente ao coração. Eles são a prova viva de que as atitudes alicerçadas no amor, por menores que sejam, provocam explosões de luz no mundo, com poder de iluminação que vai muito além do alcance da nossa vista e de nosso pífio entendimento. São provas vivas que mesmo já falecidas exercem tamanha influência, porque sua contribuição não foi material, mas foi para a alma, podendo, portanto, atravessar o tempo e durar para sempre, em forma de memória indelével e poderosa.
Sejamos, portanto, canhões de luz ambulante, deixando um rastro de amor e união. Que façamos por onde merecer lembranças carinhosas. Que possamos ser tomado como exemplos, não para nossa glória, mas para a melhora do mundo inteiro.

Esse texto é dedicado à memória do meu querido avô César, que completaria 85 anos no dia 20 de janeiro. Ele é, literalmente, uma dessas pessoas que pode já ter partido, mas continua extremamente vivo em nossos corações, porque fez por onde em sua trajetória. Professor de Psicologia e Filosofia. Possuidor de ouvido absoluto. Dono de uma voz a qual, para a minha felicidade, escutei cantando muitas belas óperas, e de uma das mais bonitas risadas que já ouvi. Co-fundador da Universidade Santa Úrsula e professor da PUC. Violonista. Dono de um gênio forte, mas principalmente um coração enorme sempre disposto a ajudar quem precisassse, fosse quem fosse. Devorador de livros, porém muito cuidadoso com todos eles. Extremamente inteligente, culto, bem-humorado, sarcástico e engraçado, amigo de muitos. Um pai e um avô dedicado, maravilhoso, cujos momentos compartilhados comigo podem não ser tantos, mas cuja lembrança pelo homem esplêndido que era já vale por muitos.

O post é dedicado a ele porque foi inspirado nele, há muito tempo. Desde que ele se foi para descansar, eu sempre pensava: se eu for metade do que meu avô foi, já estarei realizada. É com ele que eu vejo o que vale a pena, foi isso que ele deixou de legado pra mim, para os meus irmãos, e para tantas pessoas: o estudo, o esforço, a cultura, a inteligência, mas principalmente a amizade, a compaixão, a alegria, o amor.

Estão vendo? É assim que se deixa rastro. É assim que se é eterno. Quem quiser viver para sempre, seja como ele.

Também dedico esse post ao meu amado irmão, aniversariante do dia, Daniel. Porque ele também deixa rastro desde agora com seu coração grande e doce, seu jeito amigo de todos, sua inteligência, altruísmo, constante atenção às necessidades alheias, que acabam por não ser alheias, já que ele muitas vezes as toma pra si; seu jeito maravilhoso de ser um ótimo pai do menino mais fofo do mundo!; seu jeito paternal de ser o primogênito, cuidando de seus irmãos menores sempre, até mesmo quando já começou sua própria família com nossa querida Jussara. Ele segue muito bem o exemplo do nosso avô, e se torna, então, um excelente exemplo para todos nós.

Parabéns pelos 30 anos tão bem vividos e, de certa forma, já eternizados. Com muito amor, da sua caçulinha!